Advogado de seis réus da Operação Lava Jato, o paranaense Marlus Arns de Oliveira não vê a utilização da prática em grande escala como um bom sinal
Curitiba – Advogado há 25 anos e responsável atualmente pela defesa de seis réus da Operação Lava Jato, o paranaense Marlus Arns de Oliveira acaba de apresentar sua tese de doutorado, focada no advento da colaboração premiada. Apesar do interesse em torno do tema e da repercussão que ganhou ao negociar as delações do ex-diretor da Petrobras Renato Duque e de executivos de empreiteiras, ele disse, em entrevista à FOLHA, que não vê a utilização da prática em grande escala como um bom sinal. “A vulgarização da colaboração premiada pode levar ao fracasso do instrumento. Não serve para todos os casos e não é boa para todos os casos. É um instrumento grave, em que a pessoa reconhece crimes, mas abre mão da sua ampla defesa, do contraditório e do direito ao silêncio”, pontuou.
Segundo o criminalista, os acordos devem ser buscados apenas nas situações em que efetivamente não haja outra saída para a defesa. Na tese, ele também aponta benefícios e malefícios da prática, que avalia ter evoluído a partir de 2013, com a sanção da lei 12.850. Ao estabelecer condições especiais e premiações mais abrangentes aos colaboradores, a legislação deu, em sua opinião, nova roupagem ao instituto. “A colaboração existe na lei brasileira desde a década de 1990 e ficou famosa, não tão utilizada, mas famosa, com o caso do (doleiro Alberto) Youssef, do Banestado. Só que a lei não previa o formato da colaboração. Ela simplesmente previa que haveria uma redução de até dois terços da pena. O resto ficava muito a critério da polícia e do Ministério Público”, contou.
Arns decidiu estudar o assunto por considerá-lo, além de importante, inédito do ponto de vista acadêmico. “Desconheço que exista outra tese de doutorado sobre colaboração premiada. Já temos alguns livros, poucos – inclusive um de Londrina, de um amigo meu, chamado Walter Bittar (“Delação Premiada – Direito Estrangeiro, Doutrina e Jurisprudência”), – mas pouca literatura sobre o tema. E o segundo ponto é o indicativo de um caminho que me parece que foi tomado pelo Direito Penal brasileiro, rumo ao Direito Penal Negocial, que é o Direito Penal norte-americano, com mais restrições de liberdade, menos garantias individuais e com mais negociações, onde se encaixa a colaboração premiada. Não tenho dúvidas de que está havendo uma mudança de paradigmas”, afirmou.
O advogado teve participação em todas as operações da Polícia Federal (PF) desde o caso Banestado. No entanto, recorreu à delação pela primeira vez no ano passado. “Não fiz em todos os casos. Tenho clientes que fizeram e outros que não fizeram. E nunca fiz em casos que não sejam da Lava Jato”, relatou. A ferramenta é considerada fundamental para o avanço das investigações relativas ao escândalo de corrupção da Petrobras, que na última sexta-feira entraram em sua 27ª fase. Os ex-executivos da Camargo Corrêa Dalton Avancini e Eduardo Leite, por exemplo, foram condenados a quase 16 anos de prisão, no entanto, devido às contribuições, cumprem pena em regime domiciliar.
MELHORIAS
Para Oliveira, contudo, há uma série de questões a serem aprimoradas no que diz respeito ao cumprimento da Lei 12.850, como a criação de um banco de dados de acordos precedentes, a ser consultado como base, e a restrição do uso em se tratando de agente hierarquicamente superior. “Um artigo que escrevi até sobre isso era da Máfia das Sanguessugas em São Paulo, em que os agentes superiores fizeram uma colaboração e jogaram a culpa nos subordinados. A colaboração não serve para isso, senão fica como um salvo conduto para a prática de crimes. Então, são coisas que ainda nós temos para melhorar.”
Por outro lado, o criminalista se mostrou contrário à limitação no número de delações, como acontece nos acordos de leniência, referentes a pessoas jurídicas e que são costurados pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). “Na lei do Cade, só podem ser feitas duas leniências. Já a colaboração não tem número máximo, nem mínimo. Fica a critério do Ministério Público aceitar ou não fazer a negociação. Não acredito que seja o caso de limitar, e sim de valorar a importância de cada colaboração e verificar se realmente é importante para o órgão que investiga e, acima de tudo, para a defesa utilizar esse instrumento”, opinou.
Mariana Franco Ramos
Fonte: Folha Web