O Brasil passa por um momento econômico grave e turbulento. Sob o prisma empresarial, tal gravidade decorre de um cenário de responsabilização civil e administrativa das pessoas jurídicas frente a prática de atos de corrupção, ilícitos licitatórios e fraudes contratuais relacionados às administrações públicas nacional e estrangeira, bem como, da responsabilização criminal dos dirigentes destas mesmas pessoas jurídicas.
Entretanto, tal responsabilização não decorre desta ou daquela operação policial, mas sim da efetiva aplicação de novas leis de combate à corrupção, que buscam acima de tudo a transparência de todos os atos empresariais e sua real fiscalização.
Destaque-se aqui a denominada Lei Anticorrupção (Lei 12.846/2013) que prevê a responsabilização de empresas que praticam atos lesivos contra a administração pública, e também por atos de corrupção praticados por terceiros em seu benefício, punindo-as com perdimento de bens e multa de até 20% do faturamento bruto anual da empresa. E, ainda, a Lei das Estatais (Lei 13.303/2016), que regulamentou o estatuto jurídico das empresas públicas, sociedades de economia mista e suas subsidiárias, orientando as compras, contratos e licitações de obras, serviços e bens.
Também merece menção a Norma Antissuborno editada pela ABNT NBR ISO 37001, de março de 2017, que orientou empresas de pequeno, médio e grande porte quanto ao estabelecimento, implementação, manutenção, análise crítica e melhoria de um sistema de gestão antissuborno.
Sempre importante lembrar que esta “nova” legislação não afastou a aplicação da Lei 8.666/1993, que trata dos crimes de licitação, tampouco da Lei 8.429/1992, que cuida da improbidade administrativa.
No cenário internacional vivenciamos momento idêntico e de forte pressão dos organismos internacionais para o combate à corrupção, bastando analisar as normativas da Convenção Interamericana contra a Corrupção, da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico – OCDE, e da Convenção Penal sobre corrupção do Conselho Europeu, sendo desnecessário lembrarmos dos subsídios trazidos pela lei americana denominada FCPA – Foreign Corrupt Practices – e pela legislação britânica UK Bribery Act.
A meu ver, a melhor alternativa para o empresariado brasileiro é o investimento em compliance, obrigando suas empresas a adotarem boas práticas de gestão, prevenindo com isso a ocorrência de crimes empresariais relacionados à corrupção. As medidas de compliance devem ser utilizadas não apenas no combate à corrupção, mas também evitando a prática de suborno e prevenção de crimes concorrenciais, lavagem de dinheiro e cartéis.
O movimento empresarial de “estar em compliance” representa uma postura ativa do empresariado em adotar boas práticas que evitem crimes, conquistando um forte diferencial competitivo no universo corporativo. A ética como estratégia de negócios indicará que a empresa age dentro das leis e demonstrará ao mercado sinais de confiança e solidez.
Na atual conjuntura, e não poderia ser diferente, o compliance passou a estar presente também nas empresas públicas. A título exemplificativo, a Petrobras, por meio de um novo modelo de gestão, passou a avaliar seus fornecedores com um programa denominado Due Diligence de Integridade – DDI.
Em sua última licitação de publicidade, a maior da história da propaganda estatal, num edital de R$ 550 milhões, previu a contratação de duas agências de publicidade pelo período de 30 meses. O referido edital é considerado o mais rígido já realizado e já é tido como referência para os próximos editais da administração pública.
Entre os documentos a serem apresentados, está um questionário específico de integridade que questiona se as agências concorrentes participam de alguma atividade de combate à corrupção e se algum dirigente mantém negócios na esfera pública – incluindo a própria Petrobras. Também consta no questionário se algum dirigente já foi preso, se é investigado ou foi condenado por fraude ou corrupção.
Os vencedores da licitação, para estarem autorizados a assinar o contrato, terão de comprovar o seu bom histórico de relacionamento com agentes públicos e apresentar programa próprio de compliance fundado em normas do Ministério da Transparência e Controladoria-Geral da União.
Integridade – A implementação do compliance deve abranger todos os departamentos da empresa, pública ou privada, envolvendo todos os níveis hierárquicos da companhia, principalmente o seu mais alto escalão.
Um diagnóstico correto, partindo de verdadeira investigação interna, permitirá a análise e mapeamento de riscos, gerando um código de conduta claro para todos os integrantes da empresa e diminuindo sensivelmente o risco de fraudes. O programa deve ser minucioso prevendo até mesmo uma clara política quanto a distribuição e aceite de brindes, patrocínios e doações.
Estamos frente à necessária existência de um código de ética, auditoria interna e departamento de controladoria, sendo possível (e muitas vezes desejável) que as auditorias sejam terceirizadas.
Fundamental para o programa de compliance é o treinamento de toda equipe e a checagem quanto a idoneidade dos fornecedores e prestadores de serviço minimizando riscos, inclusive com um canal interno para o recebimento de denúncias anônimas ou não.
Pesquisa da Associação Internacional de Investigadores de Fraudes aponta que 40% dos desvios de conduta descobertos pelas empresas são revelados por denúncias de funcionários ou fornecedores. Evidentemente, a gestão dos casos denunciados exigirá um processo investigativo impessoal buscando confirmar ou descartar as informações relatadas.
Especificamente no campo jurídico, o compliance deverá ser aplicado em todas as áreas, numa visão ampliada daquilo que costumamos designar como advocacia preventiva comumente utilizada no direito do trabalho e no tributário. A verificação rígida de processos judiciais, contratos e de todos os atos jurídicos representará eficiência ao programa de integridade.
Finalmente, a proteção da imagem e reputação de qualquer empresa, bem como o seu reconhecimento, estão intimamente ligados a adoção plena de um sistema de compliance, permitindo a sobrevivência num mercado altamente competitivo, e diferenciando-se de forma ética como uma companhia que cumpre fielmente a legislação vigente.
Fonte: ESPD – Escola Superior de Direito Público