***Inaiá Botelho
Está em trâmite no Senado Federal o Projeto de Lei n.º 4257 de 2019 que visa modificar a Lei nº 6.830/80 (Lei de Execução Fiscal) para autorizar a execução fiscal extrajudicial, bem como para instituir a arbitragem tributária.
No que diz respeito à arbitragem, há que se elogiar a iniciativa legislativa de incluir no ordenamento jurídico brasileiro mais uma hipótese de resolução extrajudicial de conflitos entre o particular e a administração pública, representando a arbitragem tributária um grande avanço.
Isso não quer dizer que a proposta apresentada não mereça alguns ajustes, especialmente no que diz respeito às hipóteses restritivas de sua utilização.
De acordo com o projeto de lei a arbitragem será instaurada por iniciativa do contribuinte/executado e somente será cabível nos casos de embargos à execução fiscal, ou seja, nos casos onde já exista uma execução fiscal ajuizada contra o contribuinte.
Além disso, o projeto somente autoriza o uso da arbitragem para contribuintes/executados que garantam o juízo da execução com garantias dotadas de maior liquidez, no caso, depósito em dinheiro, fiança bancária ou seguro garantia.
De acordo com o projeto a justificativa para a restrição é a de garantir maior agilidade na recuperação do crédito fiscal por parte da Fazenda Pública, autorizando que a mesma, caso vencedora da lide arbitral, possa levantar o valor logo que se finalize o procedimento, tornando desnecessária a busca por bens e procedimentos de alienação.
Apesar da legítima preocupação do legislador, não deveria ser esta a única motivação para o uso da arbitragem tributária, posto que também deve ser considerado o legítimo interesse do contribuinte em resolver suas pendências fiscais, bem com a busca da administração pública tributária pela justa solução do conflito.
Além disso, tal restrição configura violação ao princípio da isonomia[1], na medida em que a Lei de Execução Fiscal prevê a possibilidade de que o contribuinte preste outras modalidades de garantias, como a nomeação de bens à penhora, inclusive de terceiros[2].
Neste contexto, o projeto deveria franquear a todos os contribuintes/executados que garantam o juízo da execução, em qualquer das modalidades de garantia do juízo previstas no artigo 9º da Lei de Execução Fiscal, o direito e se utilizar da arbitragem.
Ousando pensar além do projeto, se de fato há intenção de dar efetividade e celeridade à resolução dos conflitos envolvendo contribuintes e administração pública tributária, é de todo salutar permitir o uso da arbitragem também nas hipóteses de impugnação administrativa por parte do contribuinte, independentemente de qualquer garantia, possibilitando que as divergências sejam resolvidas antes mesmo da constituição definitiva do crédito e inscrição em dívida ativa. Neste caso, optando o contribuinte pela arbitragem, a sentença arbitral seria definitiva, inclusive evitando futuro litígio judicial acerca do tema, haja vista que nos termos do artigo 31 da Lei de Arbitragem[3] a sentença arbitral possui os mesmos efeitos da sentença judicial.
De qualquer forma, a proposta apresentada precisa ser objeto de maior aprofundamento. Considerando a relevância do tema é de todo recomendável que seja aberta oportunidade para debates, com ampla participação de representantes dos contribuintes e das fazendas públicas (União, Estados e Municípios) para que a arbitragem tributária seja pensada e concebida de forma a se tornar uma efetiva forma de resolução de conflitos entre Fisco e contribuinte.
Inaiá Nogueira Queiroz Botelho
Advogada
– OAB/PR 31.840 e Coordenadora do Departamento Tributário do Escritório Arns
& Andreazza Advogados. Especialista em Direito Tributário pelo IBET –
Instituto Brasileiro de Estudos Tributários. Membro da Comissão de Direito
Tributário da OAB-PR (Gestão 2019-2021). Presidente da Comissão de Arbitragem
da OAB-PR (Gestão 2019-2021). Presidente em Exercício do Conselho da ARBITAC –
Câmara de Mediação e Arbitragem da Associação Comercial do Paraná (Gestão
2017/2019)
[1] Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: (…) II – instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos;
[2] Lei 8.630/80 – Lei de Execução Fiscal:
Art. 9º – Em garantia da execução, pelo valor da dívida, juros e multa de mora e encargos indicados na Certidão de Dívida Ativa, o executado poderá:
I – efetuar depósito em dinheiro, à ordem do Juízo em estabelecimento oficial de crédito, que assegure atualização monetária;
II – oferecer fiança bancária ou seguro garantia;
[3] Art. 31. A sentença arbitral produz, entre as partes e seus sucessores, os mesmos efeitos da sentença proferida pelos órgãos do Poder Judiciário e, sendo condenatória, constitui título executivo.