ADVOGADO DESPONTA NA LAVA JATO COM NEGOCIAÇÃO DE DELAÇÕES
10.08.2015
Preso pela segunda vez há quatro meses, o ex-diretor da Petrobras Renato Duque decidiu trocar o renomado escritório carioca que o atendia desde seu envolvimento na Operação Lava Jato, em novembro, por um advogado de atuação discreta e, até poucos meses, desconhecido em âmbito nacional: o paranaense Marlus Arns de Oliveira.
A mudança aconteceu após Duque decidir pela delação premiada, trilha já percorrida por 28 investigados do caso.
Arns, 45 anos e advogado há 22, foi quem conduziu os acordos de colaboração de Dalton Avancini e Eduardo Leite, ex-executivos da Camargo Corrêa.
Os dois foram condenados a quase 16 anos de prisão, mas, devido à delação, não voltarão para a cadeia e irão cumprir pena em regime domiciliar. Também foi o acordo que permitiu a ida dos empresários, que ficaram quatro meses presos, para casa.
O advogado confirma que o resultado funcionou como vitrine de seu trabalho. “A procura aumentou, não dá para negar”, disse à Folha.
Além dos dois executivos da Camargo e de Duque, o criminalista também conduz negociações de colaboração com o MPF para mais dois nomes da Lava Jato: o publicitário Ricardo Hoffmann, preso na sede da PF em Curitiba, e o assessor do ex-deputado Pedro Corrêa Ivan Vernon, que está em liberdade.
Para ele, a procura vem dos anos de experiência na área (“De cada dez operações da Polícia Federal no Paraná nos últimos anos, meu escritório estava em nove”, diz), somado à coragem de experimentar novidades do direito penal, como a delação premiada.
“São poucos os que estão dispostos a quebrar barreiras e preconceitos com institutos mais modernos de defesa”, afirmou, referindo-se à colaboração premiada.
Seu escritório, onde atendeu a reportagem, ocupa oito das nove salas do andar onde começou a carreira, em 1997, dando expediente em um conjunto de 70 metros quadrados. Além da área criminal, seus sócios também atuam no terceiro setor, Direito Civil e Trabalhista.
Para os concorrentes, porém, Arns vem despontando porque há poucos advogados interessados nesse mercado, e também pelo bom trânsito que tem junto a procuradores e à Justiça Federal paranaense, por ter atuado em outros casos na região.
“Cria-se um relacionamento de confiança. Não tenho dúvida de que os próprios procuradores indicam advogados para fazer delação”, afirmou um criminalista que também atua na Lava Jato.
A força-tarefa do MPF em Curitiba rechaça a possibilidade. “É impróprio falar que há advogados com melhor trânsito aqui. Todos têm o mesmo acesso”, afirmou o procurador Orlando Martello.
MUDANÇA DE LADO
Até a Lava Jato, Arns fazia parte do coro de críticos da delação. Professor da Academia Brasileira de Direito Constitucional, ele sempre falou contra o instituto, e admite que provavelmente continuaria fazendo isso se não tivesse entrado na operação.
“Depois que firmei os acordos, não dei mais aulas. Quando voltar, vou mostrar que é um caminho da defesa, mas que precisa ser debatido, estudado e aprimorado”, disse à Folha.
Quem conhece Arns acredita que a condução de acordos se encaixa com a personalidade “conciliadora” e “equilibrada” dele.
Quando disputou a presidência da OAB Paraná, em 2006, Arns foi da oposição, numa campanha aguerrida.
Com seu perfil gregário, porém, conseguiu o apoio de todos os advogados eleitorais do Estado -do PSDB ao PT. Ficou em segundo lugar, e, nas eleições seguintes, articulou a união das oposições numa única chapa.
“Ele é um líder conciliador”, diz o advogado Guilherme Gonçalves, colega e amigo há mais de 20 anos. “Está mais para Ulisses Guimarães do que para Tancredo Neves.”
Na Lava Jato, o perfil se repetiu. “Lembro que, quando íamos falar com o Eduardo [Leite] no parlatório e o encontrávamos amargurado, Marlus o deixava desabafar pelo tempo que fosse preciso”, conta o irmão do executivo, Edgard Leite.
Para ele, Arns soube criar um “laço de afeto” com o cliente. “Só depois disso ele se pronunciava, mesmo que tivesse algo urgente para resolver. “
Fora do escritório, o advogado é escoteiro e maratonista. Já correu quatro meias neste ano. É sobrinho-neto do arcebispo de São Paulo, dom Paulo Evaristo Arns, e tem o costume de ir semanalmente à igreja.
Pessoas próximas dizem que a vida de Arns não mudou após a Lava Jato –à exceção da agenda, que ficou mais concorrida. “É o mesmo carro, o mesmo apartamento”, conta o irmão Henrique Arns. “Não posso dizer que ele ficou mais rico. É simples, não ostenta”, emendou.
Uma integrante da equipe de Arns garante que os honorários não alcançaram a “tabela Catta Preta”, que, segundo comentários do mercado, variava de R$ 2 milhões a R$ 5 milhões por delação. Pelo menos não ainda.
O paranaense tem outro desafio: a concorrência do conterrâneo Figueiredo Basto. Pioneiro no Brasil em delações premiadas e há mais de dez anos nesse mercado, Basto tem quatro acordos homologados e um em negociação na Lava Jato.
Fonte: Folha
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